Notícia publicada pelo jornal Diário da Manhã — 2 de maio de 2016
Welliton Carlos
O licenciamento ambiental é um dos mecanismos que o estado utiliza para impedir que o particular destrua a natureza. Em termos técnicos é o controle administrativo sobre as atividades que interferem nas condições ambientais. Graças ao artigo 225 da Constituição Federal o Brasil instalou um sistema que protege o meio ambiente — ao menos na teoria e no papel.
A licença seria uma espécie de filtro preventivo desta proteção. A questão é que muitos empreendedores e especialistas afirmam que o sistema brasileiro está atrasado e prejudica tanto o meio ambiente quanto a economia. De acordo com a norma constitucional, “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
O problema acontece quando o Estado não só se esquece de atuar como efetivo fiscal da lei ambiental como quando faz vistas grossas para várias situações de ameaça ecológica — em Goiânia, por exemplo, o próprio Tribunal de Justiça está sob uma nascente. Recentemente, um supermercado comprou uma rua. E uma empresa multinacional polui o odor na região Norte de Goiânia sem que nada seja feito para garantir o artigo 225 aos moradores.
O problema mais grave das licenças ambientais é a demora em sua concessão e muitas vezes a ineficácia da fiscalização. “Trata-se de procedimento administrativo importantíssimo, que garante, dentro da estrutura hierárquica, a proteção ambiental. Por meio da licença é que o Estado autoriza a instalação de empreendimentos, serviços, indústrias, etc. Mas quando demora demais vira um tormento”, diz José Fonseca de Alencar, gestor ambiental.
A dificuldade mais drástica — diz o especialista — é a falta de profissionais habilitados para oferecer o serviço. “Falta gente e com isso os empreendimentos ficam esquecidos na gaveta. A licença é um documento que exige estudo minucioso. E muitas vezes realmente gasta tempo, daí exigir a presença de profissionais capacitados. Os estados estão sendo desmantelados e os concursos públicos são cada vez mais raros. Existem mais fiscais para o trânsito do que para a natureza”, diz o advogado Carlos Alberto Moreira, especialista em direito ambiental.
De acordo com levantamentos divulgados por entidades de empreendedores, o prazo médio de obtenção do aval do Estado para começar a tocar obras e parques industriais tem aumentado a cada ano. O exemplo do Rio Grande do Sul é clássico: ocorreu um aumento deste tempo em 40% a partir do início da década. Cerca de 910 dias são gastos para que um empresário obtenha a licença. O tempo é inimigo do sucesso do empreendedor, que não raro desiste do projeto em meio à demora do licenciamento.
A própria estrutura de distribuições de competências ambientais suscitam questionamentos de toda ordem. “O licenciamento muitas vezes é enfrentado dentro da própria administração. É comum, por exemplo, conflitos judiciais entre Ibama e Incra”, afirma João C. Barbosa, advogado agrarista. Outro conflito comum é o município que pretende realizar o licenciamento sem comprovar condições. “Acontece que o licenciamento dá poder, possibilita ao chefe do Executivo estabelecer multas. Muitos gostam do exercício deste poder de polícia, de restringir as liberdades individuais”, diz.
MUNIC
Na última semana, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou pesquisa em que revela uma demanda reprimida de municípios que desejam realizar a fiscalização e expedir licenças ambientais.
A Pesquisa de Informações Básicas Municipais – Perfil dos Municípios (MUNIC) 2015, revelou que menos de 1/3 dos municípios realizam licenciamento ambiental. De acordo com o estudo, em 2015, 30,4% (1.696) dos municípios realizavam licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades de impacto ambiental local. Conforme o levantamento quantitativo, o percentual é ainda mais baixo entre os municípios de menor classe de tamanho de população. Assim, nos municípios de 5.001 a 10 mil habitantes, o número chega a 21,3% (341 cidades).
Projeto de lei visa aprimorar licenças ambientais através do uso de sistema de auditorias
Wilder Morais, proposta de auditorias: É mais adequado, mais rápido e mais barato que o órgão ambiental analise os relatórios de auditoria preparados por especialistas” De acordo com o senador Wilder Morais, existe um modelo que não abre mão do rigor da licença e reconhece a realidade administrativa da União, Estados e municípios — cada vez menos aptos a realizarem inspeção eficiente no local do empreendimento.
O senador goiano apresentou o projeto de lei n. 34/2016 que insere na legislação federal a figura da auditoria. “O Estado não tem pessoal suficiente para acompanhar o desempenho ambiental dos empreendimentos”, reconhece o senador. Para o parlamentar, a adoção de auditorias compulsórias não prejudicam as empresas: “A realização de auditorias evita e reduz as sanções administrativas e penais, bem como as reparações por danos causados ao meio ambiente”.
A auditoria ambiental compulsória substituiria a visita do órgão público no local, mas não impediria que atos de fiscalização ocorressem posteriormente: “É mais adequado, mais rápido e mais barato que o órgão ambiental analise os relatórios de auditoria preparados por especialistas do que verificar in loco os milhares de empreendimentos que devem ser acompanhados”.
Wilder Morais afirma que ocorreria uma antecipação do problema. “Assim, antes que ocorram grandes danos, será realizada uma auditoria, que é preventiva e econômica”. Rio de Janeiro e Minas Gerais, informa Wilder, já possuem legislação que estabelece a auditoria ambiental compulsória. O que o senador goiano deseja é aplicar a proposta de forma uniforme no resto do país. “No âmbito da União apenas as entidades exploradoras de portos organizados e instalações portuárias e os proprietários ou operadores de plataformas e suas instalações de apoio estão obrigados a realizar auditorias ambientais”, explica.
Wilder afirma que é necessário aumentar o efetivo de servidores ou criar soluções que mantenham a qualidade das licenças e da análise, mas que também sejam ágeis. “A licençaexige um excesso de estudos e informações prévias, o que causa grande morosidade na implantação de projetos importantes para o Brasil”.
De acordo com o parlamentar, a regulação com racionalidade é o grande trunfo do país para sair da crise atual: “Não se pode conceber que o Brasil abdique de explorar suas riquezas naturais porque o Estado é incapaz de promover uma regulação que permita racionalidade e sustentabilidade nessa exploração”, diz.
Senado aprova proposta que dispensa licenciamento para obras
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado aprovou na quarta-feira, 28, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que dispensa licenciamento para obras públicas. O tema é polêmico e chama a atenção de ambientalistas e defensores dos rigores da norma. Conforme Goiano Sidney, da ONG caminhosways, a ideia agride todo o sistema de defesa do meio ambiente brasileiro. “Não é a melhor solução para a natureza. É a melhor para quem quer explorá-la”, diz o ambientalista, que acusa um complô empresarial para destruir as riquezas naturais do país.
Conforme a proposta, a PEC 65, apresentada pelo senador Acir Gurgacz (PDT-RO) e relatada pelo senador Blairo Maggi (PR-MT), bastará a apresentação de um Estudo Impacto Ambiental(EIA) pelo empreendedor. Desta forma, o processo de licenciamento ambiental perde sua existência da forma como é hoje realizado. O memorial da proposta diz que a PEC “tem por objetivo garantir a celeridade e a economia de recursos em obras públicas sujeitas ao licenciamento ambiental, ao impossibilitar a suspensão ou cancelamento de sua execução após a concessão da licença”. A proposta terá que ser ainda avaliada pelo plenário do Senado Federal.
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